domingo, 25 de agosto de 2013

25 anos

Estava uma noite quente e convidativa para passear, de forma que decidimos fazer o regresso a casa de Querida Mãezinha, a pé.
Tinhamos acabado de ver uma revista no Parque Mayer, não me lembro qual, e ainda vinhamos a rir, revendo os sketchs mais engraçados.
Prolongando o passeio, decidimos ver as montras no Chiado e assim, subimos a Rua do Carmo (cheia de esplanadas em betão), continuámos pela Rua Garret, descemo-la outra vez e seguimos descendo pela Rua Nova do Almada.
Lembrámos outros tempos em que eu, pequenita, de mão dada com pai e mãe, ali ia pela altura do Natal para ver as iluminações; recordei as manhãs passadas em frente às montras, onde a Gigi se demorava, de caderno e lápis em punho, copiando os modelos que as Clientes lhe tinham pedido para reproduzir; pormenores das golas, dos forros, uma botoneira diferente...e eu esperando (im)pacientemente o prometido croissant na Bénard.
Não sabíamos nessa altura que seria essa a última vez que o víamos assim.
Na manhã seguinte acordei com um telefonema de Querida Mãezinha em lágrimas; o Chiado estava a arder. "Como?", perguntei ainda estremunhada.
Tomei um banho rápido, vesti-me a correr, apanhei a minha fiel Nikon F2 e voei para o comboio; nunca uma viagem S. João do Estoril/Cais do Sodré me pareceu tão longa.
Foi com o coração apertado, de máquina em punho e lágrimas nos olhos que subi a correr a Rua do Alecrim.
A confusão era muita; policia, bombeiros, muita gente só para ver; a policia e os bombeiros afastavam as pessoas e impediam-nas de entrar, mas eu, penso que por causa da maquina fotográfica que segurava e por causa do colete de fotógrafo (para colocar as diferentes lentes) consegui passar e enfiar-me naquele Inferno.
Não sei descrever o que vi; muito fumo, um calor insuportável, gente a correr, por cima de mim, numa varanda uma botija de gás explode e, ainda estou para saber como, não me atinge a mim e nem a ninguém...
Um medo e ao mesmo tempo uma ânsia de registar...a meio da tarde fomos impedidos pela policia de continuar a circular.
Fui para o estúdio de um amigo revelar o que tinha registado; seríamos uns cinco dentro da câmera escura...comparámos os registos de um e de outro; as fotos não faziam jus àquilo que os olhos tinham visto...pensámos que tinha sido ali o fim do Chiado.
E foi; foi o final de um Chiado parado no tempo, com lojas desactualizadas e morrendo em agonia, que veio a dar lugar a um Chiado cosmopolita e vibrante, uma das zonas mais vivas e mais visitadas de Lisboa.

10 comentários:

  1. Algo me diz que darias uma boa fotojornalista... :)

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  2. E não ficaste com nenhuma foto? Podias colocar aqui...

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    1. Tenho muitas, muitas, mas em papel fotográfico (ainda não havia máquinas digitais e eu não as digitalizei nunca) mas estão em Portugal, e eu na Holanda...

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  3. Olha nesse dia fui escalada para evacuar um dos edifícios culturais que havia na zona e como não havia tempo de tirar tudo...era olhar para o que havia e cada um de nós fazia uma avaliação à pressa do que tinha de seguir primeiro e do que seria abandonado...tamanha responsabilidade sufocava-me, bem jovem que era ainda nessa altura...quase mais do que o fumo que enevoava as janelas...felizmente o fogo não chegou lá...mas jamais esquecerei...isso e as memórias de menina no Chiado!!!
    Bjs
    Maria

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  4. Também estava em Lisboa nesse dia... Ficam as memórias... Bj

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  5. Pena que não tenha as fotos ctg sexinho!! *

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  6. O Chiado é o exemplo de um bom renascimento. Já não tens as fotografias?

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  7. Querida Sexinho, e no dia seguinte um outro acontecimento,que havia também de marcar o País,e principalmente os que gostavam dele,durante muito tempo não consegui ouvir as suas músicas,e se eu gosto dele,Carlos Paião.

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    1. Verdade Luisinha...e ao que sei era um homem bom.

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    2. Foi logo no dia seguinte? Também eu gostava dele e ainda hoje sei algumas músicas de cor...

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